Filosofia
a capacidade de ficar só e a capacidade de amar
“A concentração é bem mais difÃcil de praticar em nossa cultura, em que tudo parece agir contra a capacidade de concentrar-se. O passo mais importante no aprendizado da concentração é aprender a ficar só consigo mesmo, sem ler, sem ouvir rádio, sem fumar, sem beber. Na verdade, ser capaz de concentrar-se significa ser capaz de ficar só consigo mesmo — e esta capacidade é precisamente uma condição da capacidade de amar. Se me ligo a outra pessoa porque não posso suster-me por meus próprios pés, ele ou ela podem ser um salva-vidas, mas a relação não é a de amor. Paradoxalmente, a capacidade de ficar só é a condição da capacidade de amar. Quem quer que tente ficar só consigo mesmo descobrirá quão difÃcil isso é. Começará a sentir-se inquieto, nervoso, ou mesmo a experimentar considerável ansiedade. Estará disposto a racionalizar sua má vontade em continuar com essa prática pensando que ela não tem valor, é simplesmente tola, toma muito tempo, e assim por diante. Observará também que lhe vêm à mente todas as espécies de pensamento, que tomam conta dele. Ver-se-á a pensar em seus planos para o resto do dia, ou numa dificuldade no trabalho que tem a fazer, ou aonde ir à noite, ou em qualquer número de coisas que lhe encherão a mente — em lugar de permitir que ela se esvazie. Seria útil praticar uns poucos e muito simples exercÃcios como, por exemplo, sentar-se em posição repousada (nem espreguiçada, nem rÃgida), fechar os olhos e tentar ver em frente deles uma tela branca, tentar remover todos os pensamentos e imagens que interferem, tentar acompanhar a própria respiração; não pensar a respeito dela, nem forçá-la, mas simplesmente acompanhá-la — e, ao fazê-lo, senti-la; tentar, além do mais, ter o senso do seu “Euâ€; eu = mim mesmo, como o centro de minhas forças, como o criador de meu mundo. Dever-se- ia, pelo menos, fazer esse exercÃcio de concentração todas as manhãs durante vinte minutos (se possÃvel, mais) e todas as noites antes de deitar-se. â€.
~ Erich Fromm, em “A Arte de Amarâ€, pg. 84
“
A solidão é a doença do nosso tempo“, disse recentemente
Thich Nhat Hanh. Para uns, a evitação do estar sozinho pode se manifestar ao
ligar a tevê para que ela fique falando sozinha e “dar a impressão de ter alguém em casaâ€, para outros na necessidade de programar
um encontro no fim-de-semana para evitar que se fique sozinho em casa no sábado ou domingo, ou ainda qualquer evento esportivo ou cultural “porque se não ficaria em casa sem fazer nadaâ€, para outros ainda talvez se manifeste ao
acessar o celular ininterruptamente para evitar o silêncio ou o vazio (assista Louis C.K. falando disso), ou mesmo buscar numa
relação conjugal o preenchimento do desconforto de estar sozinho. Há várias maneiras de sentir e evitar, das menores às maiores, e talvez a mais moderna de todas seja
estar ocupado — “estamos ocupados e ficamos ocupados o dia todo para nos conectarmos, mas isso não ajuda, não reduz a quantidade de solidão em nósâ€, diz Thich Nhat Hanh.
Nesse trecho o psicólogo, sociólogo e filósofo alemão
Erich Seligmann
Fromm (1900-1980) também parece estar falando de algo parecido com a
meditação. Além de começar falando em “
concentração“, também fala a respeito de “muito simples exercÃcios como, por exemplo,
sentar-se em posição repousada (nem espreguiçada, nem rÃgida), fechar os olhos e tentar ver em frente deles uma tela branca, tentar remover todos os pensamentos e imagens que interferem,
tentar acompanhar a própria respiração“. A concentração pode ser um aliado na meditação, já que a mente do homem ocidental parece estar cada vez mais errática e dispersa, mas não há um real medicamento para essa evitação (da solidão) a não ser enfrentá-la, ficar a sós naturalmente. Com tudo o que aparece. Fromm fala em “ficar só sem ler, sem ouvir rádio, sem fumar, sem beberâ€, e a gente pode adicionar “sem TV, sem Internet, sem celular, sem cachorro, sem gato†etc. Isso caso quisermos sermos capazes de amar.
FONTE:
http://dharmalog.com/2013/10/21/paradoxalmente-capacidade-ficar-so-condic%CC%A7a%CC%83o-capacidade-amar-erich-fromm-classico-arte-amar/
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