Filosofia

A Mulher e o quase homem.

Querida Sofia,

A relação pode ter durado 3 semanas, 4 meses ou 2 anos. Posso estar a falar de uma situação presente ou do passado. Pouco importa.

Quando entramos numa nova relação, por vezes hesitante, podemos levar connosco muitos medos e mágoas do passado. Aos poucos, vamos nos deixando embalar porque o ser humano, apesar de muito resistir, não consegue ficar muito tempo sozinho. Embalamo-nos com as mensagens de bom dia, as declarações de amor, os pratos partilhados no restaurante, as surpresas à saída do trabalho, os presentes dados cheios de significado. Começamos a elaborar planos de futuro, juntos, a pensar que valia mesmo a pena sonhar a dois para que cada um se realize e se complete ainda melhor.

De repente, o casal que se formava, num dia que se queria bastante feliz, tem um acidente de carro. E imagina que, com o carro completamente revirado, o homem, condutor e a mulher, ao seu lado, não conseguem sair do mesmo. Têm de lutar muito, e ainda estão muito abalados com o choque da batida. Minutos mais tarde, o homem sai do carro. A mulher fica feliz por ele se ter soltado, por ele estar bem e começa a ver ali uma oportunidade para aquele homem, o seu homem, ajudá-la a sair daquela tortura. E é então que o homem, já livre, desata a correr. Correr para longe. A mulher grita sem compreender. Será que ele foi buscar ajuda? Só pode. Só pode ser ESSA a razão pela a qual o homem da sua vida a deixou ali, naquele sufoco, sozinha. As horas passam. Os dias passam. Não surge ninguém. Depois de muita luta, momentos em que se desistiu e momentos em que se tentou tudo por tudo de novo, quase a arrancar a pele, com sede, desesperada, a mulher conseguiu soltar-se. Levantar-se foi difícil, demorou dias. Mas conseguiu levantar-se. Sozinha. Ergueu-se. Fez-se à vida com a única pessoa em quem podia realmente confiar: ela própria. Uns dias depois, recuperada, cruzou-se com o homem. O que era o seu homem, mas agora já não sabia o que era.

“Então, tudo bem? Estás com boa cara. Livraste-te daquilo, fico contente por ti!” diz ele, como se nada fosse.

Mas..

Onde esteve ele naqueles dias de sufoco? Porque não fez nada para a ajudar, para a apoiar? Porque não citava o problema do abandono que era maior do que um elefante rosa entre eles?

A resposta é fácil, mas engolir é mais difícil.

Cobardia.

Viu recentemente uma imagem de um homem que dizia que faria tudo pela mulher, mas em caso de tiroteio, ela que se virasse sozinha. A imagem faz sorrir em geral. A ela, não a fez chorar, mas apenas reiterou que não era o que queria ela. Implorou que uma mulher qualquer agarrasse nesse tal semblante de homem e o fizesse seu, que se aguentasse a sua cobardia só podia ser uma mulher valente. Que ela... não era valente. Não tinha nem coragem nem estômago nem vontade de germinar sonhos e uma vida a dois com um homem daquele género. E recomeçaria assim, sem medo algum da sua parte, a sarabanda do solteirismo, mas sem desespero de encontrar uma nova pessoa. O chato, o mais chato, é recomeçar. Recomeçar uma relação com uma nova pessoa, quebrar de novo aquele gelo, aquele medo da intimidade… que seca. As pessoas dizem que não há nada melhor que o início das relações. Ela apreciava mais o seu prolongar, as suas conquistas cotidianas, os sonhos feitos a dois. Mas infelizmente, das relações todas nas quais acreditou, o que lhe ficava para sempre na alma, eram mesmo as separações.

Apertando RECOMEÇAR.

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