Filosofia
Carta à filha que (ainda) não tenho
Não imagino como vais ser. Não sei como vais ser. Acho que nunca sonhei contigo. Nunca te materializei. Não sei sequer que nome gostaria de te dar. Não quero pensar nisso hoje. Seria prematuro. Não imagino como vais ser. Por vezes gostaria de ter a certeza que vais ser como eu. E que tudo vai correr bem. Por outras digo-me que desejar-te isso seria desejar-te mal.
Será que vais crescer como eu, se cresceres muito amada? porque eu conto amar-te perdidamente. Porque vais sair de mim. E vais ser minha. E se eventualmente não saires de mim, e se eu te escolher, e se tu me escolheres, vais ser minha. E vou amar-te. E vou dizer-te que te amo.
Será que vais crescer como eu se eu disser que podes sonhar? e se eu não te disser aos dois anos que o Pai Natal não existe? Será que se eu te deixar sonhar, vais conseguir ser madura?
Será que vais crescer como eu, se eu estiver sempre ao teu lado? Se eu acompanhar cada um dos teus passos? Se eu comprar contigo o teu primeiro sutiã, se eu viajar apenas contigo, se eu fizer programas para estar contigo e conhecer-te melhor?
Se eu te dêr o que eu tive e não te dêr o que eu não tive, será que vais ser diferente, apenas para seguirmos a lei de Murphy? Será que eu vou falar contigo sobre tudo o que não se podia falar lá em casa, vamos ser amigas? Será que vais chegar ao final da tua adolescencia com mágoa de mim se eu nunca te tiver dito que te amo?
Será que o homem que eu escolher para ser teu pai vai ajudar-me a criar-te? Vai ajudar-se a si proprio sendo feliz de ser teu pai? E vai ser presente? E vai ter veia para ter filhos? E vai ter veia para ser bom marido e mostrar-te o que é ser homem?
Será que o homem que eu escolher para ser teu pai vai ser quem eu realmente escolhi? Será que ele vai materializar os teus sonhos ou destrui-los em mim?
Não imagino como vais ser, mas não quero que chores tanto quanto eu chorei. Não quero que te sintas tão sozinha. Não quero deixar-te ir mora longe de mim aos 14 anos. Não quero mostrar-te que estou farta de ti. Não quero dar-te mundos e fundos sem dar-te o calor do abraço do amor. Não quero exceder-me diminuindo o que eu tive a mais. Não quero privar-me aumentando em ti o que eu tive de menos.
Será que vais ser simpática com os outros se eu tratar-te como a rainha do meu coração? Será que vais gostar de ajudar os outros se eu mimar-te?
Será que sendo tua mãe, tu, minha linda filha, vais ensinar-me que é normal ter medo e melhor ainda é sentir que o vencemos? Será que eu vou ser uma pessoa inteira sem ter-te? Seremos mais felizes morando num casebre no sul do mundo comendo milho com dendém e vivendo com dificuldades mas unidas? Seremos mais felizes se morarmos no sitio mais "in" de Paris, sem privações mas tão independentes de nós próprias que nos vamos esquecer de sermos a nossa própria gente?
Será que eu vou poder dizer-te e contar-te tudo o que vivi antes de te ter? e dizer-te que os homens prestam apesar de já ter sido pisada, traida, humiliada, tomada por parva, rejeitada, mal amada? Será que eu vou deixar-te viver a tua vida e caires do teu lado para aprenderes a levantar-se sozinha e estares pronta para este mundo? Será que aos 15 anos, vais pedir-me para emancipar-te?
Será simplesmente possivel que eu te tenha um dia apesar do pavor que tenho de ter quem quer que seja? Será que estou pronta a amar assim, amar tão forte, amar que só de pensar já se sofre?
Não sei qual será o teu nome, mas quero ver-te livre.
Não sei de que cor serão os teus olhos, mas quero ser-te, livre.
Não sei se vais ser alta como eu, mas quero ter-te livre.
Não sei se vais gostar mais de mim ou do teu pai, mas quero querer-te livre.
*
Hoje, aos 22 anos, não sei qual é a receita certa. Nem posso planear hoje o que vais ser. Como vais ser. Como te vamos chamar.
E não é possivel saber a receita hoje. Nem sei se as mães que o são têm a receita com elas. Elas parecem saber e ter tantas certezas. Mas guardam as incertezas e os medos para elas. Ou não. Então posso apenas admirar. E fugir disso. E querer aproximar-me disso.
Não sou perfeita hoje. Nunca fui nem vou ser. Accordingly, não poderei ser uma mãe perfeita. Nem tu serás perfeita. Mas podemos ter coisas boas entre nós. Podemos ser coisas boas para nós. E vamos ser. Se um dia eu fôr abençoada por te ter.
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