Do dinheiro das (outras) bloggers
Filosofia

Do dinheiro das (outras) bloggers


Versailles - from Pinterest
Querida Sofia, 

Já leio o blog da famosa Chiara (nem link precisa) há alguns anos, mas devo confessar que raramente leio os comentários. 1/Porque são mesmo muitos, 2/porque não trazem, em 95% dos casos, nada de relevante em relação ao que é ali escrito mostrado, 3/porque há sempre uma legião de pessoas que lhe pergunta, é inevitável: “mas quanto custou isso?” ou “mas como é que consegues comprar isso tudo?”. E já reparei, que ela, com paciência ou não - não sei o que a move -, sempre responde e diz os preços dos sapatos, dos sacos ou, quando lhe perguntam como é que ela tem ESSE poder de compra, ela desfaz-se em desculpas – breves – e explica que tem a sorte de ter uma “família abençoada”.
Está aqui algo que não compreendo, que seja na vida virtual ou real, a necessidade de perguntar algo de tão pessoal quanto os recursos financeiros de alguém. Talvez o tenha feito quando comecei a blogar (mas eu tinha 17 anos quando abri o meu primeiro blog, não é a mesma coisa que ter 24... ou 30... ou 40), mas não vejo o cabimento de justificar-me perante gente que não conheço de lado algum. Uma coisa que as pessoas por vezes parecem não querer ver é que não temos todos nem nunca teremos todos exactamente a mesma vida. Há os que têm posse financeira, há os que têm uma vida familiar sólida, há os que têm as melhores namoradas ou os melhores maridos do mundo, e há quem tenha todos os seus membros e todos os seus sentidos a funcionar plenamente. Mas, no meu conceito, é impossível termos tudo. Eu sei, e já aqui admiti, que tenho inveja de pessoas com uma vida pessoal que lhes dê felicidade, com maridos atentos e absolutamente geniais, com carreiras com as quais sempre sonharam e na qual têm sucesso, porque é, no fundo e na superfície, o MEU sonho de vida, o que quero alcançar quando tiver as idades delas. Mas nunca me deu para ir comentar, com o meu nick ou de forma anónima “ai é, o teu marido é isso tudo? Vais ver, um dia ele vai-te trair, e vais cair” e tais. Porque, no fundo, não é o que lhes desejo. Se quero ser como elas, um dia, quem sabe, se Deus me permitir, quero que continuem a mostrar(-me) o exemplo, enquanto se manter nos limites da realidade e do que pode ser dito publicamente, claro. Eu compreenderia, quanto à posse material, se vivêssemos todos NO MESMO PAÍS, e trabalhassemos todos NA MESMA EMPRESA, e tivéssemos todos O MESMO SALÁRIO, que as pessoas se sentissem injustiçadas. Mas, que me lembre, quando abri o blog em 2006 no blogger, quando aceitei as “rules and guidelines” – que não li e que quase ninguém lê – não devia estar ali escrito “querida blogger, a partir de agora, você vai receber XXX € e ai de si que mostre que ganhe mais e que pode ter mais e que tenha mais que outros e que não declare, a cada post, como fez para ganhar mais do que isso”. 
Vou comparar o meu caso com o da Chiara, pois o meu caso é o único que conheço bem e o único que quero conhecer: eu NUNCA na minha vida, nos próximos 50 anos que viva, vou ter o mesmo estilo de vida e posse material que a Chiara. E, se no fundo, deixei de a ler enquanto estava no mestrado, porque ela frustrava-me, porque eu não sabia bem a um momento dado como sair do marasmo no qual tinha colocado a minha vida, e via alguém, da minha idade, que tinha tudo, foi apenas aos poucos que me disse que é normal. Não há acordo tácito entre ela e eu (e o resto do mundo) para que tenhamos a mesma vida. No entanto, depois de meses de amargura pessoal, dei-me conta que a culpa não era dela se eu estava na merda, e ela não tinha de deixar de mostrar o que tem e conquista só porque os seus leitores não podem ter o mesmo. Acho, que pelo contrário, além dela ser linda, é uma das coisas que nos atraí nela, o estilo de vida que nunca poderei alcançar, que faz sonhar, que faz querer sempre com que tenhamos coisas melhores, que sejam mais importantes (como pagar a renda de casa) ou mais frívolas (comprar sapatos e sacos Balenciaga). Outro exemplo que posso dar é o da minha amiga qui pétait plus haut que son cul, a americana de San Francisco, que quando lhe falava dos meus problemas, ela comparava aos dela e de decoração da sua casa. O que me magoou não foi o facto dela ter uma nova casa do outro lado do mundo. Foi o facto dela não considerar a gravidade do meu problema na época, pondo a par com a questão que rodopiava na sua cabeça. Na volta, para as pessoas abastadas, os problemas resumem-se a isso. Não é o caso para mim, nem nunca será, no entanto, sei que a vida é mesmo assim, fazer o quê... Para ser bastante sincera, não sei se é da vida aqui, se é do estilo dos Franceses, mas não consigo falar de dinheiro em público, custa-me muito, apenas consigo (se consigo) com as pessoas que me são bastante próximas ou nem isso. Sinto-me mal quando as pessoas dizem em alto e bom som, o quanto ganham, quanto pagam de renda, e quando me perguntam a mim esses valores. Para mim, é a mesma falta de respeito que me perguntarem quantas vezes dormi com o meu namorado na mesma noite, como pode ser perguntarem a idade a uma mulher (ainda não cheguei ai), o quanto ela pesa (I am okay with that, sou uma baleia de 80 kgs). Mas falar de dinheiro, não. É feio. No meu conceito de vida, é feio. Quando não tinha, não falava (dizia que me faltava, mas não dizia quanto), e agora que trabalho, odeio que me perguntem quanto ando a receber. E esse é o MEU conceito de vida, não obrigo ninguém a tê-lo, porque cada qual faz o que quiser. Apenas quero salientar que não temos todos a mesma vida, nunca vamos ter, tenho coisas que tu queres e não tens, e tu tens coisas que eu quero, mas não tenho, e enquanto não nos conformarmos com essa (plena? Dura? Verdadeira?) realidade, não vamos a lado algum a não ser apodrecer e azedar, enquanto poderíamos apenas nos inspirar e tentar ir além do que já somos. Bom, agora vou trabalhar, porque não é a Chiara que me dá de comer.



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