O mundo em transformação: contexto para a formação docente continua
Filosofia

O mundo em transformação: contexto para a formação docente continua




A formação inicial é fundamental para o exercício profissional, mas para que a mesma torne o profissional apto a desenvolver as competências necessárias a uma realidade em transformação é preciso está apto a aprender com a própria experiência. Numa perspectiva em que a formação do ser humano não começa nem termina na escola, mas que acontece ao longo da sua vida, como aponta o relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI:

Atualmente, o mundo no seu conjunto evolui tão rapidamente que os professores, como aliás os membros das outras profissões, devem começar a admitir que a sua formação inicial não lhes basta para o resto da vida: precisam se atualizar e aperfeiçoar os seus conhecimentos e técnicas, ao longo de toda a vida. (DELORS, 2001, p. 161-162).

Frequentemente, no ensino formal, o professor deve ser capaz de apresentar oralmente um conteúdo com clareza, propor problemas que existem apenas no papel, resolver algumas questões como modelo, sugerir uma série de exercícios aos alunos, elaborar uma prova que exige o conteúdo formal e cobrar disciplina. Embora muitas destas habilidades ainda sejam necessárias hoje, não são suficientes no contexto de uma sociedade interconectada e com mudanças que se processam ?a velocidade da luz?.

Hoje, mais do que isso, o professor precisa planejar e dirigir situações de aprendizagem, preocupando-se não apenas com o ensinar, mas também com o aprender. Isto significa uma preocupação com a ação do educando no sentido de conduzi-lo a ações mais ativas na construção do próprio saber. Ao invés de transmitir os conteúdos formais, o educador pode criar situações em que o educando precise agir para resolver e não apenas ficar ouvindo alguém apresentando um conteúdo ao ele nem compreende sequer quais foram as questões que o originaram. ?O espírito cientifico proíbe que tenhamos uma opinião sobre questões que não sabemos formular com clareza. Em primeiro lugar é preciso saber formular problemas? (Bachelard, 1996, p. 18).

Se o aprendiz era visto como uma tábula rasa e cabia ao professor depositar conhecimento (usando uma expressão freireana), hoje é necessário levar em consideração os conhecimentos que o aprendiz construiu fora da escola para ancorar as novas informações e promover a aprendizagem significativa. ?Aprendizagem significativa, segundo Ausubel, é o processo pelo qual uma nova informação (um novo conhecimento) se relaciona de maneira não arbitrária e substantiva (não literal) a estrutura cognitiva do aprendiz? (Moreira, 1999, p.36). Neste contexto, não faz o menor sentido pensar a avaliação escolar nos moldes de um processo apenas classificatório, seletivo, pontual e estático. As provas formais que apenas são utilizadas para estabelecer uma nota e ponto final, não podem ser chamadas de avaliação. E o problema não está na prova, mas o que é feito com ela. Qualquer mecanismo de coleta de dados - como a prova, o trabalho em grupo, a produção textual... - só se transforma em avaliação quando dele resultam ações que intervenham no processo (Hoffman, 2001; Luckesi, 2003). E se as conjunturas atuais exigem uma aprendizagem significativa em detrimento à mera memorização literal, então é necessário efetivar a avaliação escolar. Para garantir a aprendizagem significativa é necessário ter indícios do que o aprendiz já conhece concretamente, fazendo da avaliação um mecanismo preocupado com o passado (o que ele aprendeu na escola e fora dela), com o presente (o que ele está aprendendo) e com o futuro (o que ele pode aprender de forma significativa).

Há controvérsias e dúvidas sobre a escola ideal a atender as exigências deste novo século. Porém estamos convictos que o conhecimento não pode ser transmitido, mas é construído. Esta construção pode acontecer via aula receptiva, todavia esta não deve ser a única estratégia pedagógica.

O ato de aprender não é um fenômeno individual, mas uma construção social que envolve, no mínimo, duas pessoas. Permanecer aprendendo perpassa pelo universo fascinante da leitura, reflexão e discussão das idéias do escritor dentro do ambiente de trabalho. É preciso que os professores, professoras, coordenação, direção da escola encontrem-se periodicamente em reuniões político-pedagógicas e que nelas dialoguem sobre os problemas da escola, discutam projetos interdisciplinares, compartilhem leituras de revistas, livros, artigos e provoquem conflitos cognitivos uns nos outros e, com isso, produzam teorias como releituras continuas de suas práticas. O palco para a formação docente precisa ser a escola, levando em consideração todos os seus atores, teorias e práticas concretas. O desafio da qualificação cotidiana deve ser superado na dialética dos diversos pensares que compõem a riqueza das diferenças que convivem no mesmo cenário.


Bibliografia:

BACHELARD, Gaston. A Formação do Espírito Científico: contribuições para uma psicanálise do conhecimento. São Paulo: contraponto, 2002.
HOFFMANN, Jussara. Avaliar para promover: as setas do caminho. Mediação: Porto Alegre, 2001.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem na escola: reelaborando conceitos e recriando a prática. Salvador: Malabares Comunicações e Eventos, 2003.
MOREIRA, Marco Antônio. Aprendizagem Significativa. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1999.


Cleidson Carneiro Guimarães,
é Engenheiro Civil, mestre em Ensino, Filosofia e História das Ciências,
professor de Química e Robótica Pedagógica.
Endereço eletrônico: [email protected]

Fonte: Jornal Mundo Jovem
Imagem em: www.e-formacao.org/



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