Como sobreviver num open-space 101*
Filosofia

Como sobreviver num open-space 101*


Net-a-porter offices in London. Image source: http://stylebykling.nowmanifest.com/2011/03/25/net-a-porter-2/

Querida Sofia, 
Bem, bem, bem. Este é o tema dilema da minha vida, neste momento e no passado. Fui educada por alguém que era um pouco (um pouquinho, vá) anti-social, e que sempre nos ensinou que 1/temos de ficar sempre na nossa casa, 2/não devemos ir para a casa dos outros, 3/temos de ficar SEMPRE na nossa casa e sair o minimo possivel e temos de ficar SEMPRE na nossa casa e não falar com ninguém. Então, não nasci nem cresci para ser o animal-social que (acho ser) sou hoje, mas para isso tive de lutar. Por exemplo, receber couch-surfers em casa, serviu sobretudo para quebrar a barreira do “não falar com ninguém”. E de seguida, como expliquei aqui algures o ano passado, quis mudar de amigos e ares, então comecei a sair mais, em after-work, sozinha ou acompanhada, para vencer essa minha fobia da socialização e para conhecer novas pessoas. Funcionou tão bem que agora sou um animal-social (ou quase, há quem seja melhor do que eu na matéria). Bom, isto tudo para explicar que na minha vida profissional ideal, eu estaria num escritório sozinha. Mas tal nunca me aconteceu; o mundo corporate em França, das grandes empresas, é bem para a frentex e temos de dividir espaços, para capitalizar no espaço e melhorar a colaboração entre os colegas de trabalho (porque estou a explicar e tentar vender este conceito? Eca meleca...)
Já tive três experiências: da primeira vez, estive num open-space com dezasseis pessoas, da segunda, apenas com três e agora, somos... sei lá... 50? 60? 100???? 
Problemas com os quais mais me confronto: o barulho/zumbindo avuvuzelado constante/bater de portas/ouvir as chamadas dos outros/aturar as risadas dos outros/ouvir a conversa pessoal dos outros/ter pessoas constantemente nas costas/e, por consequente, a olhar para o nosso pc/é preciso falar com todo o mundo, estar atento a tudo e ao mesmo tempo desligado, enfim, o horror.


Posto isto, como sobreviver?

1/Headphones: os auscultadores podem tornar-se nos teus melhores amigos. Por exemplo, passo o dia a ouvir notícias, com o auscultador num ouvido e o outro livre, para estar atenta – um mínimo – ao que se passa à minha volta. É que se houver uma alerta incêndio, não quero ser a última a saber. E também, por uma questão de educação. Quoique, vejo muita gente aqui com os dois auscultadores ao mesmo tempo, mas aposto que põem a música bem baixinho para poderem estar atentos.
2/Serviço mínimo: é preciso ser minimamente civil e social com os colegas de open-space porque são pessoas com quem passamos mais tempo durante o nosso dia (pelo menos aqui em França, onde entra-se cedo e sai-se tarde, que isto não é Londres ou Nova Iorque, onde às 5pm podes ir curtir a vida. Depois perguntam-se porque os Franceses estão sempre deprimidos... tomá lá!). Por exemplo, como expliquei, eu SEMPRE recuso a pausa café que esta gente insiste em fazer. A semana passada, uma colega chamou-me aparte e disse que eu deveria aceitar um dia antes que o pessoal achasse (ou ficasse com a certeza) que não vou com a cara deles. 
HOJE, dia 10 de Agosto de 2011, fiz um esforço e fui tomar um café com as matracas e não morri. Talvez volte a repetir. Em Setembro.
3/Desligar: é preciso saber desconectar-se. Eu tenho essa capacidade. Como não sou uma pessoa muito curiosa – não sou muito de perguntar muita coisa – não me interessa as conversas que têm ao telefone, com namorados, mães e afins. Então consigo desconectar-me quando vejo que a conversa não é comigo. E acho que se não conseguisse fazer isso, morreria. Se és daquelas pessoas que não consegue se concentrar com barulho, muito curiosa e futriqueira das vidas dos outros, o open-space não vai ser o melhor lugar para trabalhar para ti. Há coisas que temos de aprender. 
Neste caso em particular, nos headquarters do cálcio, tenho bastante sorte pois temos vários espaços (corredores e/ou salas) onde podemos nos isolar, levando o laptop, pois há internet wireless e ser, por momentos, uma ilha isolada, num embargo do mundo decidido por nós mesmos.
4/Tenham modos: estás no trabalho, não estás em casa. Não é por teres um escritório à tua frente, que não te vemos as pernas (depende do mobiliário, eu sei, mas falo em geral). Então, se és menina, nada como mante-las fechadas (joelho contra joelho), que isto não é a Jamaica. Tivessem tido todas a educação das Doroteias da minha mãe (btw, pelo que ela me conta, as Doroteias não são nada cool... se alguém estudou com elas, que me explique porque não quero muito futricar no assunto com ela...), não seria necessário lembrar isto. Além disso, é preciso aprender a não falar alto, a evitar ter conversas muito pessoais (tem uma senhora aqui, que parece não saber isso, e quanto liga para o marido, é na base do “amor, por favor, não apostes o dinheiro da nossa conta poupança no teu jogo de poker online. Já gastaste 1 500 euros a semana passada” oh...God...shoot...me...now...!).
5/Amigos, amigos, negócios à parte: há equipas e equipas, e há algumas em que as pessoas almoçam sempre juntas, outras nas quais tens de ter os teus planos do teu lado, porque é cada um por si e fé em Deus. Mas se tiveres a possibilidade de ir almoçar com eles, pelo menos uma vez por semana, aproveita, pois é importante criar alguns laços, mesmo que matenhas alguma distância entre ti e os teus colegas.
6/Da distância: well, cada qual faz como quer, mas fazer amizades dentro do trabalho não é a melhor coisa do mundo, sobretudo se há uma ligação de trabalho directa ou hierárquica entre as pessoas. Por exemplo, já tive 3 chefes mulheres e 1 chefe homem no passado. Com ele, tornamo-nos amigos, vemo-nos frequentemente, mas isso aconteceu sobretudo DEPOIS de acabar a minha missão. Com elas, mantive uma relação de amizade cordial, já aconteceu ir a jantares pessoais, mas não fiz delas as minhas melhores amigas. Isso facilita quando as pessoas precisam ser objectivas connosco, para não misturar as coisas. E até hoje, falo com elas e adoro-as. Acho que a distância foi a melhor coisa que aprendi – com elas, ou com o passar do tempo. E, também, pelo facto de passarmos muito tempo com as pessoas, podemos achar que há ali uma ligação, mas pode apenas ser “virtual”, porque no fundo, há muita gente que só quer matar tempo e não ter nada de “real” contigo.
7/Get a grip: é preciso ter paciência. Não somos (todos) o centro do mundo, e há bons lados de se estar num open-space: podemos aprender com a experiência dos outros, dar boas risadas, pedir conselhos (de trabalho e outros), podemos aprender a pedir ajuda (eu tive de aprender isso, por exemplo...), e é bastante enriquecedor. Para ser MUITO sincera contigo, quando trabalhei em casa na sexta-feira passada, senti saudades da txurma. São matracas, mas começo a estar habituadas a elas, e, quem sabe até, gostar delas. Admito!

Para resumir, é necessário:
1 – saber isolar-se quando é necessário
2 – ser educado e respeitar o espaço dos outros
3 – fazer a diferença entre uma relação profissional e uma amizade
4 – tomar tempo para conhecer as pessoas antes de as julgar
5 – aceitar conselhos / saber pedir ajuda
6 – não levar a vida pessoal para o trabalho
7 – ser (muito) paciente.

*101 = aula de introdução, aula básica, nos Estados-Unidos
**post dedicado à Mnemósine, futura trabalhadora em open-space. You will do just fine!




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