Isto é o que pode acontecer quando falas português nas ruas de Paris pensando que ninguém vai compreender
Filosofia

Isto é o que pode acontecer quando falas português nas ruas de Paris pensando que ninguém vai compreender


Querida Sofia,
Há algumas semanas, estava numa discoteca em Bastille. Eram duas da manhã, o ambiente não estava “assim tanto aquelas coisas” para mim e só queria escamugir-me dali. Como já não tenho idade nem paciência para esperar amigas e o “oh, fica mais um pouco” dá-me calafrios, saí em direcção da estação de táxis. Foi então que vi passar um autocarro nocturno que ia de Bastille até bem perto da minha casa. Entrei e não pus os headphones nos ouvidos: há segurança em Paris mas mais vale não abusar nem mostrar sinais exteriores de coisa alguma dentro de um autocarro nocturno. E graças a Deus, tinha a minha clutch H&M (barato mais barato não há) e nada de vistoso além disso. Sentei-me e um casal sentou-se à minha frente. Até aqui tudo bem. Até eles começarem a falar um com o outro. E não sussuravam no ouvido um do outro. Não. Falavam em tom de voz normal mas não era em Francês, dai sentirem-se à vontade de dizer em alto e bom som: “môôr, esta noite vou ser tua” da parte dela e, da parte dele, uns “e eu, esta noite, lambo-te toda a…

[Piiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiib! Corta o som, Elite, corta o som!]

Oh Deus. Tinha um casal português à minha frente a dizer as maiores obscenidades do mundo (coisas fofas de um casal = obscenidades para os ouvidos dos outros). Faltou meio segundo para eu partir-me a rir quando pensei em coisas mesmo injucundas para ver se me controlava. Fala a sério. Então é assim, e este é um conselho que dou a TODOS os meus amigos portugueses (e de outras nacionalidades): em Paris, há sempre uma pessoa que fale a nossa língua, que seja numa loja, no metro, num autocarro, na farmácia. Sobretudo Português, com a quantidade de portugueses, lusodescendentes e brasileiros que moram neste país. E aquele casal estava ali à vontade, numa conversa PG13 à minha frente. Mas esse não foi o remate.

Quando pararam com aquelas declarações indecorosas, ela pediu-lhe “oh môôr, vamos descer no Champs-Elysées para tirar fotos no Arco do Triunfo?”. Ele aceitou. Assim que viram a paragem “Champs-Elysées – Clémenceau”, levantaram-se para descer. A verdade é que esse é o início da avenida. O Arco do Triunfo era cinco ou seis paragens mais longe, na praça da Estrela. E eu, tendo compreendido a conversa, poderia ter dito “não, não é aqui, esperem”. Mas damn, isso teria apenas mostrado que tinha compreendido a pouca vergonha da conversa inicial então deixei-os descer e imaginei os quinze minutos no frio que eles teriam de andar até ao Arco. Sei que errei mas eles também. Aqui fica o conselho: cuidado com as coisas que dizes em público. Há sempre alguém que nos possa compreender. Nem preciso contar o que aconteceu quando a minha irmã disse aqui em Paris que a mulher que estava à sua frente tinha “uma cara de rato” em português. Adivinhas? Pois.



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