Entrei em competição com um fenómeno estranho do qual desconheço o nome. Essa competição é simples e a mais recorrente da minha vida: saber lidar com um "não". Um ou vários. O exercício é-me aplicado vezes sem conta. Para coisas que importam. Não é um “não, não vendemos mais leite de soja com banana” (que por acaso, a minha loja de produtos orgânicos deixou de vender e ando meio desesperada), não é um “não, não nos podemos ver hoje à noite, mas amanhã, pode ser?”. Não. Não são “não” pequenos, com os quais lidamos todos os dias. São os “não” que determinam a vida. A minha vida.
“Não, não podes pedir para comprar esta casa, não podes comprar este apartamento, não vais ter este trabalho, não vais ter esta nacionalidade que te abrirá portas, não terás este amor, não podes entrar naquele país porque não és Europeia, toooo bad, não terás os teus pais atrás de ti ou contigo, não terás ajuda, não terás essa possibilidade, volta a outro momento, faz a fila, tenta de novo o próximo ano, agora não, sempre não!”. Sei que já recebi alguns “sim” aqui e ali. Muito importantes. Mas o número de “não” supera os “sim” que já recebi. E depois, quando falo sobre o assunto com amigos, muitos dos quais nunca ouviram um “não” na vida – e se ouvissem, matariam-se – olham para mim “mas Elite, és tão forte, não te vais deixar abater por isso, pois não?”. Desisti do povo porque senão ainda desistia de mim.
Esta sexta-feira, tive de lidar com (a) ansiedade. E na segunda-feira, quando peguei o telefone para perguntar “então, ganhamos?”, pensei que por uma vez na vida, eu tinha de ser muito positiva para obter um resultado igualmente positivo. E pedi a quem lidou com e soube do assunto para pensar positivo também. Olhei à minha volta e estava sozinha. Fiz o número, chamou, atendeu. “Tenho más notícias, Elite” “Não compreendo... que quer isso dizer?”, perguntei com um sorriso nervoso. “Perdemos. Ligarei-lhe-ei mais tarde para dar os detalhes, estou no metro e não é pratico falar. Okay?”. Okay. Okay. Okay. Mais um "não"? é isso? Desliguei o telefone e olhei de novo à minha volta. Continuava sozinha. Atirei o telefone ao fundo da mesa e encostei-me à minha cadeira e não consegui mais reagir. Não queria nem chorar, nem rir. Estava de novo a atravessar a porta do fenómeno, aquela porta entre a possibilidade e o fim desta, antes mesmo que se concretize nem que seja só um pouco. Uma porta que eu não contava mais atravessar nos próximos meses, para ser sincera, mas estava a atravessa-la. De novo. E como odeio essa passagem, esse corredor da alma, onde não há luz, onde existem soluções mas não as posso alcançar. E ai, o “ai Elite, és tão forte” caiu e as lágrimas bateram às janelas dos olhos. Não chorei, mas estava quase quase lá. Pessoas que não conheço de lado algum passaram perto e foram embora, e quis manter-me composta.
Levantei-me de maneira automática, como se o meu corpo de mim já não dependesse e comecei a procurar uma sala vazia. E escura. Passei por uma. Várias pessoas reunidas. Uma segunda, de novo, cheia, pessoas a debater frente a um powerpoint. Ouvia o barulho dos meus saltos a baterem forte no chão, descompassados com os meus passos rápidos, com a vontade de os atirar para longe a crescer em mim sem parar. Senti passos mais firmes e menos agudos atrás de mim, mas nem me preocupei, não tinha tempo nem a articulação suficiente para ver quem me seguia. Até que encontrei uma sala. Não era escura, mas, pelos menos, estava vazia. Fechei a porta e encostei-me contra a parede apenas para respirar. Foi preciso fechar-me para ter o ar suficiente para respirar. Estranho isso. Não sei como o meu espírito atravessou a barreira do problema até a da outra problemática. A de, no fundo, nunca ter alguém por perto com quem partilhar estas coisas em directo, quando me magoam e não quando a manteiga já não está assim tão amolecida porque estão 3°C e todo o resto parece mais fácil para barrar o pão. E, de repente (quantos “e, de repente” tenho eu usado nos últimos posts?), já não estava sozinha. A porta fechou-se tão rapidamente quanto a tinha aberto. Veio o abraço, o “let go” e a consequente paz. Afinal é isso que as pessoas procuram para sobreviver num mundo de “não” sucessivos. O abraço que te ajuda apenas a atravessar e sobreviver, que te levanta um pouco do solo por ser tão alto e, que ao mesmo tempo, não te faz perder o chão.
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