O ‘cientificamente provado’ e a questão da ‘verdade’
Filosofia

O ‘cientificamente provado’ e a questão da ‘verdade’




O ‘cientificamente provado’ e a questão da ‘verdade’


Para o indutivismo clássico, a ciência começa com a observação pura. O observador científico deve ser capaz de registrar objetiva e fielmente o que puder ver, ouvir etc. Ou seja, nesta concepção, preconceitos e subjetivismos de qualquer natureza não cabem no trabalho do homem da ciência. 

Seguindo este raciocínio, devemos concluir que é perfeitamente possível descrever o mundo por meio de afirmações advindas da observação direta, graças ao uso dos sentidos do observador não preconceituoso: o cientista, é lógico! As afirmações a que se chega (proposições de observação) formariam assim a base segura e legítima a partir da qual poderíamos derivar as leis universais e as teorias científicas responsáveis pela descrição objetiva e matematicamente clara destas mesmas leis. Poderíamos discordar deste raciocínioque acabamos de enunciar?

Obviamente que as observações, por mais exaustivas que sejam, sempre serão em número limitado. Sendo a ciência baseada na experiência, por que meios é possível extrair de afirmações singulares e numericamente limitadas (resultantes da observação), as afirmações universais constituintes do conhecimento científico? 

Segundo o epistemólogo A. Chalmers, “a resposta indutivista é que, desde que certas condições sejam satisfeitas, é legítimo generalizar a partir de uma lista finita de proposições de observação singulares para uma lei universal”. Por exemplo, pode ser legítimo generalizar a partir de uma lista finita de proposições de observação referentes a metais aquecidos para a lei “TODOS os metais se expandem quando aquecidos”.

Em síntese, para um indutivista, quais as condições que devem ser satisfeitas para que generalizações sejam consideradas legítimas?

1. o número de proposições de observação que forma a base de uma generalização deve ser grande;

2. as observações devem ser repetidas sob uma ampla variedade de condições;

3. nenhuma proposição de observação deve conflitar com a lei universal derivada

Para entender a visão do indutivista, observe a figura 1 abaixo:


Uma vez que um cientista tem leis e teorias universais à sua disposição, é possível derivar delas várias explicações e previsões. Exemplo: dado que os metais se expandem quando aquecidos, é possível derivar que trilhos contínuos de ferrovias, não interrompidos por pequenos espaços, se alterarão sob o calor do Sol. (O que é ciência, afinal? Chalmers, Alan F.  Tradução: Raul Filker. Editora Brasiliense, 1993)

Chalmers ainda salienta que, segundo essa visão indutivista:

(...) A validade das proposições de observação, quando corretamente alcançada, não vai depender do gosto, da opinião, das esperanças ou expectativas do observador. O mesmo vale para o raciocínio indutivo por meio do qual o conhecimento científico é derivado a partir das proposições de observação”. As proposições de observação que formam a base da ciência são seguras e confiáveis porque sua verdade pode ser averiguada pelo uso direto dos sentidos. Além disso, a confiabilidade das proposições de observação será transmitida às leis e teorias delas derivadas, desde que as condições para as induções legítimas estejam satisfeitas”. (...)


Contudo, contrapondo essa visão do que é o conhecimento científico, ao assistirmos às exposições de diversos físicos em um simpósio, verificamos que existem diversos modelos e abordagens para um mesmo fenômeno físico, apesar de todos eles estarem utilizando o método indutivo e estarem se baseando na “observação sistemática” do comportamento dos átomos.

Todos eles possuem apaixonados defensores que sustentam suas respectivas abordagens com grande entusiasmo, como se eles os levassem ao conhecimento de uma realidade suprema. Muitas vezes duas ou mais abordagens (que podem ser contraditórias entre si) "explicam", aparentemente, um mesmo fenômeno físico cujas divergências estão, invariavelmente, fundamentadas nos diferentes comportamentos dos seus constituintes, quando submetidos a diferentes condições e/ou nos tratamentos teóricos que lhes são dados posteriormente.

Se fôssemos ingênuos para acreditar em todos esses modelos, teríamos tantas realidades quanto temos teorias para “explicá-las”. Segundo alguns filósofos, a causa da divergência no entendimento de uma realidade pode estar relacionada ao método científico utilizado. Assim, tal método não poderia determinar o que é a nossa realidade, mas tão somente o que ela aparenta ser.

Mas, poder-se-ia questionar: como não confiar na ciência se os seus resultados são extremamente relevantes? E como pode obter esses resultados sem conhecer a realidade que está manipulando?

Há uma tendência em aceitarmos como verdades permanentes as teorias propostas pela ciência, nos colocando em uma posição passiva sob o argumento de que: "isso não se pode contestar, pois está provado cientificamente". Será que quando adotamos essa atitude não estamos nos esquecendo de que os cientistas estão condicionados a pressupostos culturais e sociais que os impede de atingirem um conhecimento absoluto da realidade? 


Texto elaborado por Silvio Motta Maximino com base nas seguintes referências bibliográficas:

“A Ciência como atividade humana”, p. 149-52., de George F. Kneller
“Fundamentos da Filosofia”, p. 242, São Paulo, ed. Saraiva, de G. Cotrim
Artigo "O que está cientificamente provado é uma Verdade?" de José Pedro Andreeta.




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